Pular para o conteúdo principal

Allan Kardec e o "espiritismo" brasileiro: uma parábola

(Por Demétrio Correia)

Suponhamos que Allan Kardec esteja ainda vivo e viajasse para o Brasil de hoje. Ele se interessa a conhecer as atividades do "movimento espírita" brasileiro e resolve visitar um típico "centro espírita".

Quantas euforias e alegrias são sentidas pelos membros desse "centro", diante da visita ilustre do Codificador!

Quantos sentimentos de entusiasmo, quantas correrias para preparar a recepção, enfeitando a instituição com tantos adornos!

O professor francês finalmente entrou na instituição e quantas pessoas, em alvoroço, o rodeavam fazendo barulho e disputando a chance de cumprimentá-lo.

Kardec, todavia, estava simpático, mas com um ar desconfiado.

As pessoas aceitavam isso, porque pensavam que o ilustre visitante estava apenas observando o ambiente. 

De repente, o diretor do "centro" se destaca, pede às pessoas para abrirem espaço porque ele queria falar com o Codificador, como responsável maior da "casa espírita".

- Senhor Kardec, deixa eu mostrar as instalações de meu centro. É com muito prazer que venho lhe mostrar os trabalhos humanos que realizamos na nossa casa.

Kardec volta a ter um ar bonachão e diz.

- Mil desculpas por eu parecer sério. Eu só estava observando. Sabe, eu sou muito atento às coisas. E me tornei mais ainda desde que fui observar os rituais das mesas girantes.

- Ah, sim! Ah, sim! Vamos, venha que eu lhe mostro as atividades sociais que fazemos.

E assim se seguiram. Viram apenas uma modesta creche e na ocasião crianças brincam com brinquedos usados. Na sala, um quadro com o principal "médium", a maior estrela da casa, com um diploma nas mãos.

Kardec fica um tanto desconfiado. Mas, educado, pergunta:

- Esse projeto é o que vocês chamam de transformador?

- Ah, professor! - diz o diretor do "centro espírita". - Sim, é profundamente transformador! Nós respiramos fraternidade dia e noite, sr. Kardec!

- Hummm... - diz ele, desconfiado. - A propósito, quantas pessoas foram beneficiadas?

- Ah, beneficiamos mais de 20 mil pessoas, em 25 anos de instituição.

- E vocês vivem com problemas de recursos?

- Não! Como instituição filantrópica, temos isenção de impostos e recebemos subsídios do governo. Fora as doações que recebemos, de cidadãos comuns a empresas.

- Muito, muito pouco. Mas deixa para lá. - disse Kardec, evitando polemizar. - A propósito, e os trabalhos mediúnicos. Me surpreende haver muitos médiuns no Brasil. A atividade parece ser fácil no país de vocês, não é?

- Ah, sim, acho que os mortos adoram se comunicar com a gente! - diz, envaidecido, o diretor do "centro espírita". - Aqui temos uma mensagem de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, psicografada há uns cinco meses. Leia.

Kardec pega o texto e lê com redobrada atenção. Não parece animado. Franze os supercílios, mas permanece quieto. Até que, uns cinco minutos depois, encerra a leitura e se prepara para comentar.

- É verdade que a mensagem mostra recados bastante positivos. Me parece uma carta alegre e otimista. - disse o pedagogo.

- Ah, claro! É mensagem de amor e esperança, de paz e fraternidade.

- Permita-me comentar, eu não sou um analista aprofundado da história do Brasil, mas essa mensagem não me soa autêntica. Soa forçadamente solene, parece um único estilo de discurso ilustrado.

- Como assim? Ela fala de amor, de Jesus, de caridade? Não leu o trecho final do texto, que diz que "somos todos irmãos"?

- Mas dizer coisas boas nem sempre é dar atestado de autenticidade.

- Como? Alguém viu uma pessoa desonesta transmitir mensagens positivas?

-  Sim. E muitas. Ah, quantas intenções lamentáveis se escondem em tantas palavras enfeitadas, tantos textos bem feitos e edificantes...

- Mas o texto que lhe mostrei é autêntico! Juro...

- Tenho cá minhas dúvidas. A propósito, me dê licença para ir. Que o senhor tenha paz e sorte na vida.

O diretor do "centro espírita" ficou decepcionado. Achou que o professor aceitaria tudo de bandeja.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Qual a relação de Edir Macedo e R. R. Soares com Chico Xavier?

(Por Demétrio Correia) Qual a relação que os "bispos" neopentecostais Edir Macedo e R. R. Soares têm com o "médium" Francisco Cândido Xavier? O leigo vai cair da cadeira e vai achar absurdo, sobretudo num dia como hoje. Afinal, fazem 15 anos do falecimento de Chico Xavier e os chiquistas devem preparar sua inundação de lágrimas. Como comparar o "iluminado médium" aos dois usurpadores da fé cristã. Simples. Porque Chico Xavier também havia sido um usurpador. Um católico ortodoxo que se tornou um dos maiores aproveitadores do legado da Doutrina Espírita. A trajetória do "bondoso médium" sempre foi marcada de muita confusão e conflitos. As pessoas devem abandonar essa teimosia infantil de achar que as confusões que envolveram o "médium" foram causadas pelos detratores. Não foram. Foram causadas pelo próprio "médium" e seus parceiros nas empreitadas da deturpação espírita. A imagem "...

Vídeo: Diferenças entre o Espiritismo Original de Allan Kardec e o Espiritismo Brasileiro de Chico Xavier

Vídeo didático ensina a diferença do Espiritismo original de Allan Kardec e o "espiritismo" deturpado de Chico Xavier e Divaldo Franco. Vale a mais ampla divulgação.

"Espiritismo" brasileiro pratica assistencialismo. Isso não é bom

(Por Demétrio Correia)  O "espiritismo" brasileiro usa táticas de manipulação da opinião pública cuja gravidade poucos percebem. Uma delas é o Assistencialismo. Uma suposta caridade que ajuda muito pouco, trazendo apenas benefícios pontuais e superficiais, mas sem transformar a sociedade. Ou então ações de relativa emancipação social que também não ajudam muito, criando cidadãos apenas "corretos", mas socialmente inócuos. O Assistencialismo é o que está por trás da "caridade" que virou a desculpa maior para aceitar a deturpação da Doutrina Espírita. A suposta filantropia vira a moeda imposta para aceitar até mesmo a aberração dos "médiuns" nada intermediários, alvos de culto à personalidade e de mais mórbida adoração. Os "médiuns" fazem falsa mediunidade, impedindo os mortos de falarem porque "falam em nome deles", ao pé-da-letra, botando na conta do além o pensamento pessoal de cada "médium...