Mensagem atribuída a Stefani Simeoni, uma das vítimas fatais do incêndio da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), em 2013, apresenta garranchos na assinatura.
(Por Demétrio Correia)
Mediunidade, no Brasil, tornou-se uma prática desmoralizada.
Virou um faz-de-conta cheio de incompreensões, distorções e até expressão da pós-verdade, fenômeno que trata mentiras absurdas como "verdades indiscutíveis".
Para começar, o próprio termo "médium" foi corrompido.
Deixou de ser o intermediário (médium), o "meio", para ser o "centro das atenções".
A partir de Francisco Cândido Xavier, criou-se o "culto à personalidade" que, por incrível que pareça, desmoraliza a função do médium.
Para piorar, os supostos médiuns tentam camuflar o "culto à personalidade" com atividades de suposta filantropia.
Essa pretensa filantropia consiste em "caridades" que mais servem de propaganda para si e que, na verdade, só ajudam pouca gente, e ainda assim de maneira medíocre.
Uma "bondade" que mais serve para explorar emocionalmente as massas do que para ajudar as pessoas, porque o que se vê são apenas ajudas poucas que nem de longe transformam a sociedade.
E isso tem o agravante de ser uma "bondade" a acobertar as fraudes mediúnicas.
Afinal, a "mediunidade" que ocorre no Brasil é muito, muito estranha.
O número de "médiuns" é maior do que se pode esperar normalmente.
Nos tempos de Allan Kardec, os médiuns eram raríssimos, não faziam cartaz de si mesmos nem para se passarem por "pensadores" ou "filantropos" e se consentiam em fazer um mero papel intermediário na transmissão de mensagens dos mortos para o mundo dos vivos.
E aqui a "mediunidade" ainda tem outra estranheza: o frequente mershandising religioso que aparece em quase toda mensagem.
Propagandismo religioso, do tipo "vamos nos unir na fraternidade em Cristo" ou coisa parecida.
Apelos igrejeiros que ocorrem até sob o nome de falecidos que haviam sido ateus na Terra.
E outro agravante nessas supostas mensagens mediúnicas é que não raro escapa alguma caraterística que destoa de aspectos individuais do morto a que lhe é atribuída autoria espiritual.
Isso derruba muitos "médiuns", por isso eles se servem de carteirada religiosa aqui e ali.
Aquela desculpa do "pão dos pobres", do "abrigo dos necessitados", "bondade" de fachada usada para legitimar fraudes mediúnicas aqui e ali.
Essas fraudes ocorrem em texto, som e imagem.
Falsas psicografias com textos que escapam dos estilos e aspectos pessoais dos supostos autores espirituais.
Falsas psicofonias, que mostram falsetes que seriam dignos de imitações em programas humorísticos.
Falsas pictopsicografias, em que pinturas supostamente mediúnicas claramente entram em conflito com os estilos dos pintores mortos nas obras publicadas em vida
No caso dessas pinturas, outro agravante: os "médiuns" não medem escrúpulos em usar apenas suas assinaturas pessoais e não as dos pintores.
Tudo isso é feito impunemente, por causa do pretexto da "caridade".
Torna-se uma "mentiunidade", neologismo que mistura "mentira" com "mediunidade".
Tudo é errado na "mediunidade" praticada no Brasil: o culto à personalidade, a carteirada religiosa da pretensa "bondade", o mershandising religioso, as irregularidades de estilo e nuances pessoais do morto a que são atribuídas as mensagens "espirituais".
Isso é de uma gravidade extrema, que deixaria Allan Kardec extremamente preocupado.
É de uma desonestidade sem tamanho, algo que se compara às atividades da Máfia.
Mensagens produzidas no escuro das salas, onde fraudes são produzidas sem qualquer tipo de transparência.
Recentemente, uma fraude foi notada nas supostas mensagens atribuídas às vítimas do incêndio da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), tragédia ocorrida em janeiro de 2013.
Uma mensagem atribuída à jovem Stefani Posser Simeoni apresentou sérios garranchos na assinatura.
Isso traz questionamentos muito sérios e extremamente graves.
Atribui-se a mensagem uma linguagem consoladora e confortadora, que presumisse ter sido escrita por um espírito tranquilo e calmo que diria para seus familiares que estava bem.
Sendo um espírito tranquilo, não teria escrito uma mensagem com garrancho, em que a assinatura do prenome era rasurada e reescrita de maneira tão hesitante e nervosa.
E isso é apenas uma das milhares de fraudes que ocorrem e que até universitários deixam passar, intimidados pela carteirada religiosa que intimida as pessoas com a retórica da "bondade".
O próprio Chico Xavier cometeu fraudes aberrantes que lhe desmerecem todo o endeusamento que recebe até quase 15 anos após seu falecimento.
São coisas que deveriam ser rejeitadas e condenadas criminalmente de acordo com a lei.
Mas o que é lei num país em estado de exceção que é o nosso Brasil?
E o que é punir em relação a ídolos religiosos que seduzem as pessoas como um canto de sereias?
A primeira condenação a um ídolo religioso que surge e vai ele, ou então seus herdeiros e seguidores, mostrar pobres carentes e velhos mendigos doentes como "carteirada religiosa".
Chegou-se ao ponto de poder usurpar um morto e seduzir seus herdeiros para arrancar-lhes apoio e confiança.
Chegou-se ao ponto de falsificar quadros, atribuir falsa mediunidade e, alegando leiloá-los "para o pão dos pobres", a Justiça nunca mover um dedo sequer contra o farsante.
A pós-verdade tem no "espiritismo" sua expressão máxima.
Mente-se e falsifica-se e é só usar o "pão dos pobres" como escudo para tudo ser "legitimado" e apoiado sem risco.
Nunca ficou tão fácil mentir e ser desonesto, usando a "bondade" para proteger atitudes tão levianas.
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