(Por Demétrio Correia)
É muito fácil, é muito cômodo, escrever sobre o sofrimento alheio.
Sem vivenciar a dor do outro, o palavreador de plantão escreve livros e dá palestras dizendo o quanto sofrer é o maior barato.
Escreve-se pedindo ao outro a aceitação do sofrimento, a renúncia ao necessário e, talvez, o apego ao supérfluo.
Vivemos numa sociedade marcada pela mediocrização social em todos os aspectos.
A Teologia do Sofrimento, o "holocausto do bem", encontra terreno fértil nessa sociedade marcada pela desinformação travestida de Conhecimento.
Temos pregadores do sofrimento alheio em várias religiões.
No Catolicismo, que lançou a teoria na Idade Média, temos também exemplos contemporâneos como de Santa Teresa de Lisieux no Século XIX e Madre Teresa de Calcutá no Século XX.
No "espiritismo", o maior exemplo vem de Francisco Cândido Xavier.
Chico Xavier não cansava de fazer seus apelos. "Sofra sem mostrar sofrimento", "aguente calado as adversidades da vida, sem reclamar", "ore em silêncio e não faça queixumes", "aceite as desgraças e agradeça a Deus".
De forma bastante sutil, Divaldo Franco também defende a Teologia do Sofrimento. Certa vez, ele disse que é "possível ser feliz em situação deplorável".
A coisa gera um grande mercado que farsantes como Sri Prem Baba, o guru dos "coxinhas", aqueles reaças que pediram o "Fora Dilma", também embarcou nessa máquina de fazer dinheiro às custas da desgraça alheia.
Algumas frases de efeito, que viram memes instantâneos do Facebook e WhatsApp - que muitos consideram o "paraíso dos estúpidos" - , já foram publicadas neste formato.
"Quando abandonamos aquilo que não nos serve mais, abrimos os canais do nosso amor para que ele possa fluir livremente", diz uma frase.
"Você passa a vida tentando ser a pedra mais preciosa, querendo que o outro reconheça o seu valor, mas não percebe que já é um diamante", diz mais outra.
"Se você quer saber onde está a sua vida, olhe para a sua sexualidade", diz uma terceira.
São frases banais, que nem precisam ser "teorizadas", mas que fazem livros venderem como água e palestras ficarem lotadas. Quantos tolos devem haver nesse Brasil!
A Teologia do Sofrimento e suas baboseiras "teóricas", nas quais o escritor ou palestrante de ocasião se comporta como se fosse um dublê de pai severo, mas cheio de conversa mole.
Ele vê o outro sofrendo um monte de desgraças e vem com muitos "incentivos" para ele aceitar as desgraças numa boa.
Não se teoriza desgraça. É bom desconfiar de quem lucra com o sofrimento alheio, achando que tem respostas para tudo.
Gente que nunca sofreu na vida e vive comercializando palavras prometendo a "salvação" para quem se conformar em ficar sofrendo e arrumar uns trocados para comprar uns livrinhos chinfrins.
A Teologia do Sofrimento é algo tão mesquinho que, se considerarmos a validade dessa teoria, os maiores tiranos do mundo teriam um grande atenuante.
Se esses tiranos, muitos de traumática lembrança, tivessem o artifício de falar palavras dóceis, ter vozes suaves e adotar poses de mansuetude, passarão a ser objetos de culto e adoração de uma parcela de pessoas.
Eles podem até colocar multidões em câmara de gás, pois, sob a ótica da Teologia do Sofrimento, basta atribuir docilmente aos infelizes um juízo de valor - tipo eles haviam sido sanguinários em outras vidas - ou, se não for o caso, dizer que a desgraça extrema é o "beijo de Deus".
Algo do tipo: "no momento mais extremo da desgraça humana, os braços de Deus se abrem para o sofredor agonizante".
Portanto, seria melhor que nunca compremos livros como esses, que tratam o sofrimento como se fosse a maior das alegrias.
Seus pregadores vivem fazendo turismo pelo planeta, viajam em aviões de primeira classe, se hospedam em hotéis cinco estrelas, posam ao lado dos ricos em colunas sociais e recebem medalhas, diplomas, troféus e outros prêmios pomposos.
Eles se enriquecem às custas do sofrimento alheio. E quem pensa que os "espíritas" dão tudo que recebem para os pobres e necessitados, engana-se: eles são os que mais se enriquecem e depositam tudo em suas contas pessoais.
É só notar a alegria exagerada dos "médiuns". Ninguém fica alegre demais porque se enriquece e dá tudo para os pobrezinhos.
Os que dão suas fortunas para os pobres são pessoas discretas, agem sem alarde, e não ficam comentando o tempo todo sobre o que fizeram. Para eles, só o bem estar do outro lhes importa.
Já os "médiuns", que fingem ter essa mesma postura, alardeiam o tempo todo, festejam o lucro de seus livros e palestras, celebram os prêmios que recebem, e, enquanto recebem medalhas, os seus assistidos só recebem migalhas.
Mas muitos brasileiros, ainda movidos pelas paixões religiosas, ainda ignoram que a fé esconde verdadeiras e enormes labaredas de vaidades e ambições humanas. Lamentável.
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