(Por Demétrio Correia)
Vamos tomar muito cuidado com o que andam falando sobre intolerância religiosa.
Tem religião privilegiada que anda recorrendo ao vitimismo toda vez que investigam suas irregularidades.
Tem corrupto denunciado por enriquecimento ilícito que anda se escondendo atrás de uma Bíblia para dizer que sofre "atos de intolerância".
Tem vencedor fingindo ter perdido uma competição e processando o segundo colocado por trapaça, usando Jesus Cristo como escudo do vitorioso de ocasião.
No que se diz a intolerância religiosa, o que vemos é que o "espiritismo" brasileiro, de repente, passou a gostar de ser confundido com umbanda e candomblé.
Os "espíritas", que nunca deram consideração, senão mediante as conveniências do momento, aos cultos afro-brasileiros, agora tentam se passar por eles.
Tem até "centro espírita kardecista", de elite, usando o vitimismo à toa, fingindo ser tão vítima quanto os terreiros de cultos afro-brasileiros dos subúrbios e zonas rurais.
O "espiritismo" brasileiro não sofre atos de intolerância religiosa.
É uma religião de elite, uma espécie de Catolicismo de chinelos, sem as formalidades e adereços da Igreja Católica propriamente dita.
Os "espíritas" são até blindados, que nem em seus erros conseguem ser questionados.
Divaldo Franco ofereceu o Você e a Paz para João Dória Jr. lançar um alimento estranho, com a camiseta do evento e o nome do "médium" escrito, e a imprensa fingiu que não viu.
Tolerância excessiva, diga-se de passagem.
Os "espíritas" já nem são o PSDB da religião, porque nem o PSDB foi tão blindado, assim.
Ser "médium espírita" é ter o foro privilegiado de só ser responsabilizado quando pratica atos positivos e agradáveis.
Quando pratica atos negativos e incômodos, os "médiuns" são até absolvidos, pois a culpa toda vai para o "obsessor".
Grande malandragem. Nem o "xará de sobrenome" de Divaldo, o ex-governador fluminense Wellington Moreira Franco, ministro de Michel Temer, tem esse privilégio todo.
Divaldo apareceu até em uma foto com Dória, com o "médium" olhando de frente para ninguém deixar dúvidas.
Mas mesmo o mais dedicado jornalista investigativo achou que o velhinho era um "mero convidado" do evento.
Só porque o evento, no caso, foi uma edição paulista, pensou-se que foi a Arquidiocese de São Paulo que havia organizado o Você e a Paz.
A entidade apenas patrocinou, o evento foi organizado por Divaldo, que não deve ficar de fora dos efeitos do lançamento de um nefasto alimento.
A retórica da intolerância religiosa não pode ser banalizada.
Aceitar a liberdade religiosa não pode ser o mesmo que aceitar que as religiões façam o que quiserem, até fazer os fiéis de gato e sapato.
Temos um "espiritismo gato por lebre" em que os postulados originais de Allan Kardec sofrem traições o tempo inteiro, setenta vezes sete vezes por ano, e seus traidores ainda dizem que são "absolutamente fiéis" ao pedagogo francês.
Vemos que em Divaldo faltou a firmeza que Kardec teria se fosse convidado a divulgar a "farinata".
O pedagogo se recusaria, e mesmo assim cobraria exames e documentos comprovando a qualidade do produto.
Não deixaria a coisa por barato. Kardec era rigoroso na cobrança de provas e documentos sobre qualquer coisa.
O "médium" baiano viu desmoronar sua fama de "sábio", "ativista" e "humanista", deixando que um alimento que ele nem tinha ideia real do que seja fosse lançado no seu evento.
Ou, se tinha alguma ideia, é porque nunca foi o "humanista" que tantas pessoas falam.
Criticar isso não é cometer intolerância religiosa.
É cometer intolerância contra os abusos que as religiões cometem sob a lona da "liberdade da fé".
Os "espíritas" se julgam a religião mais próxima de Deus, dotada de falso equilíbrio entre Ciência e Fé.
São os que apresentam a embalagem mais limpinha, mas de um conteúdo podre, de restos mofados e perecidos da deturpação de Jean-Baptiste Roustaing.
Precisamos alertar sobre a banalização do discurso de intolerância religiosa, para evitar que isso sirva de desculpa para tolerarmos abusos e erros graves.
As pessoas têm o direito de professar a sua fé, mas não tem o direito de usar a desculpa da fé para fazerem o que querem e botar a ética, a lógica, a coerência e o bom senso no lixo.
Nós não cometemos intolerância religiosa, mas é nosso dever cometer, sim, a intolerância à hipocrisia, ao abuso e ao desrespeito humano sob o rótulo da "liberdade da fé".
Temos que esclarecer isso, antes que o vitimismo de certas religiões sob a desculpa da "intolerância religiosa" abra as portas para o obscurantismo e à mistificação ainda mais intensos.
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