(Por Demétrio Correia)
Pioneiro dos fakes, Francisco Cândido Xavier iniciou sua trajetória arrivista com um livro de poemas "do além", Parnaso de Além-Túmulo.
O livro se comprova uma coleção de pastiches literários, em muitos casos parecendo verdadeiras paródias, mas que a paixão religiosa deixou passar como "obra autêntica da espiritualidade superior".
Sim, a paixão religiosa, essa orgia sem sexo e nem dinheiro, mas tão mórbida e voltada para os gozos "do outro mundo", tão levianos e lascivos.
Sabe-se que Chico Xavier não realizou os pastiches sozinho e ainda se há de analisar as verdadeiras razões desse embuste literário, sem sucumbir à paixão religiosa que sempre protegeu o anti-médium mineiro.
Aqui vamos comparar um poema de João da Cruz e Sousa (1861-1898), poeta simbolista brasileiro, e um poema do suposto espírito, publicada na referida obra "mediúnica".
À primeira vista, os poemas são idênticos em estilo e mensagem, mas cabe aqui tomar cautela e prestar atenção.
O suposto poema espiritual não tem a musicalidade poética do autor alegado, e mostra um apelo igrejeiro que Cruz e Sousa provavelmente não desejaria fazer.
O poema "mediúnico", embora evoque temáticas similares ao do alegado autor, mais parece um daqueles sonetos "qualquer nota" que mostram, na verdade, o pensamento pessoal de Chico Xavier.
Como deturpador e pastichador, Chico Xavier não pode ter seus pontos de vista pessoais "universalizados" pelos vivos e mortos, até porque ele foi uma figura ultraconservadora e retrógrada.
Vamos então iniciar, a título de comparação, com um poema publicado em vida pelo autor catarinense, intitulado "Tortura Eterna", no qual a tortura não é vista de maneira positiva.
Depois mostraremos o suposto poema "espiritual", onde o "Cruz e Sousa" fake "pensa" como Chico Xavier e escreve versos calcados na Teologia do Sofrimento defendida pelo "médium".
TORTURA ETERNA
Cruz e Sousa - 1893
Impotência cruel, ó vã tortura!
Ó Força inútil, ansiedade humana!
Ó círculos dantescos da loucura!
Ó luta, Ó luta secular, insana!
Que tu não possas, Alma soberana,
Perpetuamente refulgir na Altura,
Na Aleluia da Luz, na clara Hosana
Do Sol, cantar, imortalmente pura.
Que tu não posses, Sentimento ardente,
Viver, vibrar nos brilhos do ar fremente,
Por entre as chamas, os clarões supernos.
Ó Sons intraduzíveis, Formas, Cores!...
Ah! que eu não possa eternizar as cores
Nos bronzes e nos mármores eternos!
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AOS TORTURADOS
Por Francisco Cândido Xavier - Parnaso de Além-Túmulo - Atribuído ao espírito de Cruz e Sousa
Torturados da vida, um passo adiante;
Nos desertos dos áridos caminhos,
Abandonados, trêmulos, sozinhos,
Infelizes na dor a cada instante
Sobre a luz que vos guia, bruxuleante,
E além dos trilhos de ásperos espinhos,
Fulgem no Além os deslumbrantes ninhos,
Mundos de amor no claro azul distante...
Chorai! Que a imensidade inteira chora
Sonhando a mesma luz e a mesma aurora
Que idealizais chorando nas algemas!
Vibrai no mesmo anseio em que palpita
A alma universal, sonhando, aflita,
As perfeições eternas e supremas!
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