(Por Demétrio Correia)
O "espiritismo" brasileiro está a anos-luz de distância do legado de Allan Kardec.
Essa constatação não é transmitida, evidentemente, pelos próprios "espíritas", babando de bajulações ao pedagogo francês.
Leem traduções igrejeiras da obra kardeciana (editoras FEB e IDE) e aprendem tudo errado.
O "Kardec" que eles defendem é um tal de Cardeque que perambula pela Av. Passos, a caminho dos lugares ermos da Lapa.
E aí acabam levando gato por lebre e, em vez de aprender sobre Ciência e Filosofia, ganham de presente a nunca devidamente assumida Teologia do Sofrimento.
Uma corrente medieval, católica, que faz apologia ao sofrimento humano como "caminho para a realização humana".
Os "espíritas" tratam a vida material como uma "gincana", uma "competição".
Dizem que o sofredor não nasceu para fazer turismo ou viver prazeres mundanos.
Mas os palestrantes "espíritas" fazem turismo para exibir seu espetáculo de palavras bonitinhas.
Vivem no bem bom, hospedam-se em hotéis de notável conforto, fazem palestras para as elites e recebem um baita cachê que juram se destinar "para os necessitados".
Acham que não vivem prazeres mundanos, mas o gozo que sentem pelas luzes artificiais do prestígio religioso, uma tentação comparada ao estrelato, é extremamente mundano.
Da mesma forma, é mundana também a atribuição de que tais palestrantes já têm o passaporte para o céu.
E eles que falam para os sofredores aguentarem uma coleção de desgraças e dificuldades insuperáveis.
Insensíveis, pedem aos outros reverem desejos, necessidades e talentos.
Recomendam a eles a encarar ciladas que podem trazer aos sofredores infortúnios e mais desgraças.
Pouco ligam se os sofredores são humilhados até na Internet.
Apenas dizem para os sofredores orarem. Mas as orações só relaxam, e isso quando conseguem fazê-lo.
Os "espíritas" pouco se importam se os sofredores perdem uma encarnação inteira com infortúnios dos mais pesados.
Distorcem o ensinamento de Jesus: "Bem-aventurados os aflitos, porque deles será o reino dos céus".
E dizem, indelicadamente: "O que é um sofrimento de décadas, diante da eternidade da vida?".
Os "espíritas" se comprazem em ver os sofredores perdendo uma encarnação inteira com desgraças.
Desgraças que impedem os próprios infelizes de poder exercer o trabalho, a caridade, o progresso humano.
Porque as oportunidades que lhes são impostas só servem para perder tempo mostrando a luz para quem não quer ver, sejam amigos traiçoeiros, patrões prepotentes ou arrivistas e namoradas fúteis.
Mas os próprios "espíritas", fazendo turismo com belas retóricas, vivendo os gozos das recompensas materiais das medalhas e diplomas diversos, têm pressa em alcançar o Céu.
Eles não querem viver muitas encarnações para alcançar o prêmio dos banquetes divinos.
Fazem o possível para exibir o melhor malabarismo dos belos discursos e dos aparentes belos sentimentos.
Quando são contrariados, mordem os beiços e explodem de raiva em seus íntimos, mas respiram fundo e respondem aos questionamentos com mais textos belos.
Pouco importa se num texto elogia a urgência de Erasto e no outro atribui sabedoria a Emmanuel.
Acha que pode ser contraditório, desde que seja "por amor e pela caridade".
Esquecem os "espíritas" das trapaças que fazem, quando falam que os sofredores têm que suportar as desgraças calados.
Mas eles, os "espíritas", não querem ser contrariados, se achando na posse da verdade, no recurso da palavra final.
Eles querem ir rápido para o Céu, e tem até roteiro pronto para o retorno à "pátria espiritual":
Reencontrar amigos e familiares queridos que morreram antes, receber alguma condecoração das autoridades celestes e, de preferência, Jesus Cristo terá que aparecer sempre para acolhê-lo para levá-lo ao trono de Deus.
Sim, Jesus é obrigado a receber o pobre mortal que se acha um gênio só por publicar palavras bonitinhas.
E aí vemos os dois pesos e duas medidas.
Aqueles que sofrem demais que fiquem sofrendo e colecionando desgraças, até quando se dispõem a trabalhar, ter paciência, iniciativa e jogo de cintura.
Os "espíritas", no entanto, anseiam os prêmios do Céu, como se isso não fosse também um prazer mundano.
Ele é, sim, e muito mais materialista do que se imagina. Afinal, é materialista na essência, se não o é pela matéria bruta.
Há pessoas que vivem a vida material com mais espiritualidade do que os "espiritualizados" que sonham com os prazeres materiais no "outro lado".
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